domingo, 17 de outubro de 2010

Economistas analisam os riscos que a alta de preço dos imóveis produz no mercado

O Globo


O Índice Nacional dos Preços de Imóveis, que está para ser lançado pelo governo federal, reavivou a discussão sobre o mercado imobiliário estar sob risco de bolha. Enquanto os preços disparam, a questão divide a opinião de dois bambas da economia, como mostra reportagem de Flávia Monteiro publicada no Globo deste domingo. Decano da PUC-Rio e especialista em inflação, Luiz Roberto Cunha não antevê qualquer ameaça ao setor. Para ele, tamanha alta é fruto de fatores diversos, entre eles, o desequilíbrio entre a lei da oferta e da procura e a expansão das condições de crédito, mesmo para imóveis de valor mais alto. Já Marcus Valpassos, da Galanto Consultoria, diz que o risco de bolhas é real, principalmente, em locais onde a valorização dos imóveis foi mais expressiva, como os grandes centros urbanos, e não foram acompanhadas por ganhos relevantes de renda da população.

O GLOBO - O Índice Nacional dos Preços de Imóveis servirá, de fato, para monitorar a inflação do setor?

LUIZ ROBERTO CUNHA: Índices de preços setoriais são sempre importantes para acompanhar a evolução média dos preços de qualquer setor. No caso dos imóveis residenciais, deve-se levar em conta que as variações de preços são muito grandes, seja por cidade, por bairro e até por rua. Isso sem contar as características do imóvel. Um índice será sempre uma média, por mais que se especifiquem as diferentes características.

MARCUS VALPASSOS: Sem dúvida. Mas não gosto do termo "inflação" para descrever o objetivo do índice, já que este termo nos remete a uma ideia de evolução do custo de vida que não necessariamente anda junto com preço de imóvel. Ele servirá muito mais para acompanhamento de um setor cada vez mais relacionado a questões de relevância econômica, inclusive definições sobre juros.

E ele será capaz de prever uma bolha no setor?

CUNHA: Nos Estados Unidos, há um índice de preços de imóveis (o Case-Shiller Home Price Indices), produzido por dois economistas, para acompanhar a evolução do preço de venda de imóveis residenciais. Depois deste índice, parte das informações financeiras geradas pela agência Standard & Poor's evoluiu para um índice nacional, com subíndices regionais. É claro que um indicador assim ajuda na análise de evolução dos preços no setor, mas não garante a capacidade de prever bolhas.

VALPASSOS: O preço de determinado ativo é um dos componentes que compõem a possibilidade de que este esteja em processo desequilibrado, porém não é o único. É preciso analisar os motivos da alta a fim de determinar se este movimento é sustentável ou não no médio e longo prazos. Mas, sem um índice de preços confiável que viabilize a realização de estudos no setor, torna-se muito difícil chegar a conclusões a respeito da formação de bolhas.

Por aqui, corremos algum risco de bolha?

CUNHA: A evolução dos preços de imóveis no Brasil, assim como nos EUA e na Europa, varia muito de local para local. Aqui, a alta expressiva que temos visto em grandes cidades reflete vários fatores. Em muitos casos, representa a recuperação de preços depreciados por condições sociais e pelo desequilíbrio entre oferta e demanda. Além, é claro, da expansão das condições de crédito, mesmo para imóveis de valor mais alto, com a consolidação da estabilidade econômica. Assim, as condições no nosso mercado são diferentes de EUA e Europa, e não vejo, não me parece que haja, risco de bolha. Isso é bobagem.

VALPASSOS: Se analisarmos as motivações econômicas por trás dos movimentos dos preços, podemos chegar à conclusão de que não há excessos. O montante de crédito imobiliário ainda é baixo. As taxas de juros ainda podem cair, e a oferta de novos imóveis é limitada. Mas há um fator de instabilidade que é o aumento da dicotomia entre o valor dos imóveis e da renda das famílias proprietárias. A concentração de grande parte da riqueza em um ativo com perspectiva de desvalorização pode levar ao aumento da oferta de venda. Portanto, enxergo, sim, risco de bolhas, principalmente em locais onde a valorização foi mais expressiva e não foi acompanhada por ganho relevante de renda.

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